Sábado, 19 de julho, William Rambo, 35, piloto de Primavera do Leste, estava sozinho dentro de uma aeronave Pitts, biplano de fabricação norteamericana, a quase 1000 metros de altura, sobre Tatuí, interior de São Paulo. Ele alinhou seu avião com o box acrobático, área delimitada para a acrobacia de competição, e colocou toda potência no motor, empurrando a manete para frente. Os 200 hps de potência levaram o avião a cerca de 200 milhas por hora, cerca de 320 km/h, a ideal para iniciar a primeira manobra, um looping, um círculo completo no ar, e seguir com uma sequência de outras dez acrobacias.
No chão, cinco juízes escalados pela CBA - Confederação Brasileira de Acrobacias, avaliavam minuciosamente cada uma de suas manobras durante o Campeonato Brasileiro de Acrobacias Aéreas: ângulos, subidas, descidas, e se o competidor se mantinha dentro do box, a caixa virtual no ar de 1000 metros cúbicos, que tem marcações no chão, para referência do piloto. Possíveis saídas do box geram pontos negativos para o piloto.
Era o terceiro dia de competição. William fazia a terceira bateria de sua categoria, a Intermediária. Nos dois primeiros voos ele já havia aberto, na somatória, certa vantagem sobre os concorrentes. Só era necessário, portanto, fazer sua sequência sem erros para garantir a vitória. Os resultados só seriam divulgados no fim da tarde, depois de computadas todas as fichas de notas de todos os concorrentes.
Terminada a sequência acrobática, depois de um suave pouso, desceu do avião confidenciando preocupações com um possível erro. Poderia ter perdido pontos importantes. Enquanto o campeonato acontecia e outros competidores voavam no box executando a mesma sequência, sendo também avaliados pelos juízes, fez uma chamada de vídeo pelo celular para seu preocupado pai, Anselmo, em Primavera do Leste, para contar como foi. “Falei que não tinha ido bem no voo. Ele me chamou a atenção, cobrando concentração”, afirma William. Logo depois o telefone foi transferido para Juliano, seu irmão, que balbuciou algo, seguido de uma troca confidente de sorrisos pelo vídeo.
Juliano Rambo, 41, o principal incentivador para que William tomasse gosto pela aviação, devido a um acidente com um avião agrícola, vive há sete anos praticamente entre a cama e a cadeira de rodas, sendo cuidado pelos pais, Anselmo e Angelina, além de cuidadores profissionais.
Em 2012, o avião que pilotava chocou-se com um fio de alta tensão e caiu de ponta cabeça, produzindo uma lesão permanente em seu cérebro. William e Juliano estavam prestando serviços juntos na mesma fazenda, borrifando produtos agrícolas nas plantações. “Iríamos parar a aplicação porque a temperatura tinha esquentado, falei com ele no rádio. Ele falou que ia fazer o último voo e daí nos falaríamos pessoalmente. Acabei meu voo e ele demorou. Fui de carro atrás e vi o avião caído de longe”, relembra William sobre o dia do acidente. “Cheguei e só perguntei se o piloto estava vivo, falaram que estava”.
Decorridos esses sete anos, algumas sequelas se mantém em Juliano. “Só responde baixinho o que lhe perguntam, com pouca consciência”, explica William.
No fim da tarde, os organizadores da competição divulgam o resultado: William se tornara campeão brasileiro de acrobacias aéreas 2019. Sua preocupação com a o possível erro esvaiu-se. Ele ainda manteve uma vantagem razoável sobre sobre os concorrentes. “O que mais chama atenção é que ele é do Mato Grosso, e lá não há uma comunidade acrobática para que ele possa treinar junto, trocar ideias e experiências. Ele produziu seu resultado praticamente sendo um autodidata, com poucos treinos com técnicos”, afirmou um experiente piloto de acrobacias de São Paulo.
Além de William, Juliano, o precursor da aviação na família, também conseguiu influenciar outro irmão, o Cristiano, que também se tornou piloto agrícola. Os dois gerenciam a empresa da família, a Rambo Aviação Agrícola, em Primavera do Leste. Juliano faz falta na equipe e nos relacionamentos. “O vejo quase todo dia, mas tento não lembrar das coisas boas que passamos juntos pra não ficar mais pesado”, afirma William.
William levou o troféu na casa dos pais para que pudessem vê-lo. Houve uma pequena comemoração. Anselmo, Angelina, seu irmão Cristiano, sua esposa Fran e seus filhos, ficaram todos orgulhosos. Juliano, no quarto, prefere o silêncio, e demonstra irritações até com pequenas movimentações ou sons que atrapalhem sua paz.
Se você pudesse, por um momento, ter uma reação consciente do Juliano, em relação a essa conquista, que resposta te agradaria? “Um parabéns”, finaliza William.
Por Filipe Rafaeli, de São Paulo, especial para “O Diário”.
Publicado em 2 de agosto de 2019
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